O silêncio que veio depois
O sol de verão castigava o Cemitério do Alto de São João, em Lisboa, enquanto os amigos e familiares de António se reuniam para o último adeus. A tristeza e o desespero pairavam no ar, enquanto as lágrimas corriam incontroláveis pelas faces das pessoas que mais o amavam. A mãe de António, uma mulher idosa e frágil, desmaiou nos braços do marido, enquanto a irmã mais nova, apenas uma adolescente, tremia de dor, apertada contra o peito da mãe. O cemitério, com as suas campas antigas e os jazigos ornamentados, parecia um testemunho silencioso da morte e do luto que se desenrolava diante dele.
Mas foi quando os coveiros começaram a deitar terra sobre o caixão que algo estranho aconteceu. Uma brisa gélida, que parecia vir de lugar nenhum, começou a soprar, fazendo com que as folhas das árvores tremessem e as pessoas se arrepiassem. O silêncio que se seguiu foi ainda mais opressivo do que o choro e os soluços que o haviam precedido. E então, um som começou a ouvir-se, vindo de dentro do caixão. Um raspar e um bater, como se algo estivesse a tentar sair de dentro da madeira. A multidão ficou paralisada, sem saber o que fazer, enquanto o som se tornava cada vez mais forte e insistente. Era como se ele não estivesse disposto a partir, ou como se algo o estivesse a chamar de volta…
O que fazes?
Assumindo um choque (um whiplash, vá) emocional, coloco-me a uns dois passos da cova e aguardo, perplexo.
Depois do silêncio os gritos invadem todo o cemitério. É uma cena de pura desolação e emoção. Seria verdade? O António tinha sido enterrado vivo?
A mãe de António está a chorar descontroladamente, enquanto a irmã mais nova parece estar em estado de choque, com os olhos fixos no caixão. O pai de António tenta abraçá-la, mas ela não reage.
Uma mão começa a elevar-se da terra, logo abaixo da cova, é uma visão perturbadora. Pálida e fria, com dedos longos e finos, parece estar a tentar libertar-se. O rosto de António, com os olhos abertos e a boca torcida num sorriso macabro, é uma visão que faz gelar o sangue.
A atmosfera ao redor da cova está carregada de tensão e medo. As folhas das árvores continuam a cair, uma a uma, como se estivessem a ser arrancadas pelo vento, mas não há vento. A terra ao redor da cova parece estar a tornar-se mais escura, como se estivesse a ser sugada para dentro da terra.
O que fazes?